Atraso tucano
Movimentos criticam demora do governador paulista para criar órgão que definirá diretrizes para as políticas de desenvolvimento urbano, incluindo moradia, saneamento e mobilidade, entre outros
Após dez anos de reivindicação, movimentos sociais de São Paulo conseguiram finalmente que o governador Geraldo Alckmin criasse o Conselho Estadual das Cidades. O anúncio oficial foi feito, nesta quinta-feira (26/9), pelo chefe da Casa Civil, secretário Edson Aparecido, na abertura da 5ª Conferência Estadual das Cidades, no Memorial da América Latina, na capital paulista.
O pedido de criação do Conselho existe desde 2003 quando Alckmin também era governador mas nunca despertou interesse dos sucessivos governos tucanos de São Paulo, alternados nesse período entre Alckmin e José Serra.
A função do órgão será propor e deliberar diretrizes para a Política Estadual de Desenvolvimento Urbano, que inclui questões de moradia, saneamento básico, tratamento de resíduos sólidos e mobilidade urbana, entre outras.
O ConCidades SP reunirá 92 representantes, sendo metade do poder público (14 do governo estadual, 26 distribuídos entre as regiões metropolitanas, quatro da Assembleia Legislativa, um do Ministério Público e um da Defensoria Pública) e metade da sociedade (20 dos movimentos populares, seis de sindicatos, seis de entidades empresariais, quatro de organizações não governamentais e quatro da academia e entidades profissionais).
Os conselheiros serão eleitos no sábado (28/9), último dia do encontro, quando também serão escolhidos os delegados que representarão o estado na etapa nacional da Conferência, em novembro. À tarde, os debates definirão as linhas gerais para a política de desenvolvimento do estado. Nesta sexta-feira (27/9), serão debatidas as contribuições das etapas municipais da conferência.
Maria das Graças Xavier, coordenadora-executiva da União dos Movimentos de Moradia de São Paulo (UMM), comemorou a criação do conselho. Durante o processo de mobilização para a conferência, nós entramos em contato com muitos municípios e em alguns tivemos que praticamente ensinar como eles deveriam organizar a conferência. A convivência desses gestores com pessoas do movimento social, sindical, ONGs que discutem o tema vai ser muito importante para qualificar a discussão, avalia.
A criação do ConCidades SP é uma reivindicação que vem da primeira Conferência das Cidades, em 2003. No ano seguinte, lançamos uma minuta e apresentamos ao governador Alckmin. Ele prometeu que iria assumir, mas esqueceu o assunto, lembra Maria das Graças.
A oportunidade para avançar nesse ponto surgiu de um episódio mal explicado pelo governo estadual no processo de realização da conferência estadual deste ano. Mesmo alertado pelos movimentos sociais, o governo perdeu o prazo oficial para a convocação da conferência. Com isso, a convocação foi feita por um grupo de entidades, que assumiram a frente do processo.
Segundo Marcos Campagnone, coordenador da Comissão Preparatória da Conferência, o erro ocorreu pela mudança de atribuições da Emplasa, como resultado da criação da Secretaria do Desenvolvimento Urbano. A empresa tradicionalmente convocava as conferências, mas teve parte de suas atribuições transferidas para a nova secretaria. Com isso, ocorreu esse lapso e perdemos o prazo, afirma.
Para Graça, o problema foi político. O governo não deu importância para a conferência, deve ter avaliado que a sociedade civil não participaria. Mas o governo recebeu muita pressão dos movimentos, de outros governos estaduais e do governo federal. A delegação de São Paulo na Conferência Nacional é a maior. Como o governo não faria a conferência?, avalia.
Recebemos inclusive propostas de prefeituras ligadas ao PSDB, que se ofereceram para bancar a estrutura. Ficou chato para o governador, conta.
Com essa situação, quando o governo procurou as entidades para assumir sua parte na organização do evento, os movimentos exigiram como contrapartida a criação do ConCidades SP. Iniciou-se aí um processo longo de negociação sobre o formato do Conselho.
Outros governos estaduais criaram seus conselhos durante a 4ª Conferência Nacional, em 2010. Como o texto base desta edição tem como foco a construção do sistema nacional de política urbana, com destaque para a participação social, a criação do Conselho é uma forma de integrar essa questão, afirma Campagnone.
A proposta inicial do governo previa 39 conselheiros, sendo um terço para o governo estadual, um para representantes dos municípios e o terço final para a sociedade. Os movimentos consideraram a proposta muito desequilibrada em favor do Poder Público e lutaram por um formato semelhante ao do Conselho Nacional das Cidades, em que as várias instâncias do Estado ocupam a minoria das vagas.
Nós fizemos uma mobilização forte no dia 28 de agosto no Palácio dos Bandeirantes e incluímos essa demanda na nossa pauta. O governo insistia na composição tripartite, mas aceitou negociar, conta Graça.
Ao mesmo tempo, o governo teve que lidar com a pressão dos prefeitos da região metropolitana da capital, região mais populosa, que também cobravam mais vagas. A solução para acomodar os interesses diversos foi a ampliação do Conselho e a modificação da proporção. Quisemos contemplar todas as representações com a maior bancada possível. Foi um processo democrático e republicano de construção, explica Campagnone.
fonte: Rede Brasil Atual