Insegurança pública
Presidente de associação de delegados de SP diz que estatísticas de violência são “uma fraude”
Marilia Pansonato diz que a Polícia Civil está sucateada e delegados estão deixando a profissão
A delegada Marilia Pansonato filha, esposa e mãe de policiais militares é a primeira mulher a presidir a Associação dos Delegados do Estado de São Paulo desde 1964. Em entrevista exclusiva ao Portal R7, a delegada faz uma série de denúncias e revelações sobre a situação da segurança do Estado. No último dia 12 de março, 300 delegados se reuniram na Praça da Sé, no centro de São Paulo, para se manifestar contra a política de segurança do Estado. Segundo ela, foi um ato de indignação da categoria.
Indignação em relação às políticas de segurança pública que não satisfazem as necessidades da sociedade e ainda manipulam números para transmitir uma falsa sensação de controle.
Ela até cita uma frase do jornalista Joelmir Beting para exemplificar o que considera manipulação.
A estatística é a arte de torturar os números até que eles confessem.
A delegada afirma que os últimos números apresentados pela Secretaria de Segurança Pública foram torturados, referindo-se às estatísticas comparadas entre dezembro de 2012 e janeiro de 2013, que indicam uma redução da violência.
A forma como essa estatística foi apresentada é uma fraude. Estatísticas comparam o mês de um ano com o mesmo mês do ano anterior.
Para ela, a crise de segurança do Estado é provocada pelos baixos salários pagos para delegados, a falta de renovação dos quadros mais antigos da polícia, o sucateamento da estrutura de investigação e a deturpação das funções entre as corporações, inclusive as funções dos peritos criminais. Segundo ela, um delegado, em São Paulo, ganha R$ 7 mil de salário inicial bruto, o 25º mais baixo do País, ficando atrás apenas de Minas Gerais e Pará, o que está provocando um abandono da carreira. De acordo com Marilia, dos 3.200 delegados que existem no Estado, um abandona a profissão a cada dez dias, ou presta concurso em outros Estados.
É só atravessar a fronteira que no Paraná ele recebe R$ 13.000.
Ela cita o concurso público de dezembro de 2012, que formou 135 delegados na Academia de Polícia. Vinte e oito já abandonaram o cargo, antes mesmo de tomar pose.
As exigências para se tornar delegado são as mesmas que para um promotor. Ambos estudam a mesma faculdade (além do título de bacharel em Direito, tem que demonstrar um mínimo de dois anos de experiência jurídica). O salário de delegado é uma esmola social.
Para ela, o baixo salário nunca justifica, mas explica a corrupção nos quadros da polícia. O sucateamento se iniciou há 20 anos e nosso grito de socorro é porque estamos agonizando, mas não só pelos salários. De acordo com a presidente da associação, há ainda desvios de função que provocam o que ela chama de progressão criminosa. Cita o acúmulo de funções dos delegados nos Ciretrans (Circunscrição Regional de Trânsito), o que faz que o tempo que deveria ser dedicado à investigação seja utilizado em questões administrativas, deixando investigações mal resolvidas. Segundo ela, isso gera impunidade, porque a Justiça não recebe as informações necessárias para punir o criminoso.
A Polícia Civil foi sucateada e teve sua função investigativa esvaziada em detrimento da Polícia Militar.
A delegada cita como exemplo o programa Guardião, destinado à interceptação telefônica, que segundo ela foi retirado da Polícia Civil e entregue para a Rota (Rondas Ostensivas Tobias Aguiar).
Nós delegados de polícia somos filhos da legalidade. Não podemos admitir que a polícia aja na ilegalidade. Não dá para aceitar que se expeça alvará para que se mate, que se faça julgamento e já se apene com pena de morte e se execute. É inadmissível.
A delegada diz que a maior preocupação em relação a interceptações telefônicas feitas nos quartéis da PM é o destino dado às informações obtidas. Segundo ela, a PM a rigor não pode pedir autorização ao judiciário para efetuar os chamados grampos telefônicos, já que a atribuição é da Polícia Civil, mas ela acredita que isto estaria acontecendo quando promotores do Gaeco (Grupo de Combate ao Crime Organizado), que solicitam autorizações ao judiciário e repassam à Polícia Militar a função da interceptação.
Para corrigir estas distorções, a delegada afirma que o Governo do Estado precisa aumentar os salários dos delegados, oxigenar a carreira, criar uma carreira auxiliar na área administrativa e acabar com situações de ilegalidade.
Nossa polícia está envelhecida. Há delegados que há 22 anos alcançaram o topo da profissão como delegados de classe especial e entopem a possibilidade de ascensão dos mais novos. Deve se trazer gente com uma filosofia nova. É necessário extinguir situações que envergonham. Existe também a necessidade de se criar uma carreira administrativa auxiliar para permitir que a polícia se dedique exclusivamente à investigação e não administrar almoxarifado, frota, departamento de pessoal. Isto é um desvio de função. Nós não somos treinados para gerir, somos treinados para investigar.
fonte: Portal R7