Audiência pública

Nesta quarta-feira (31/8), a Frente Parlamentar de Enfrentamento ao Crack e outras Drogas, presidida pelo deputado Donisete Braga, debateu um tema bastante polêmico: a internação compulsória de dependentes de drogas. Para discutir o assunto, a Frente convidou o secretário de Assistência Social da cidade do Rio de Janeiro, Rodrigo Bethlem, onde a medida vem sendo aplicada, para crianças e adolescentes, desde maio último. Também estiveram pressentes parlamentares, médicos, promotores, advogados, profissionais e entidades que trabalham com drogadição.
Donisete Braga entende que a experiência do Rio de Janeiro pode nos ajudar a pautar e entender melhor esta questão.
O líder da Bancada do PT, Enio Tatto, que também integra a Frente, ressaltou que as cracolândias não é assunto do outro, é um assunto de todos nós, definindo como um problema gravíssimo que precisa ser tratado com seriedade e competência. E, já na abertura, preconizou o que seria a tônica do debate: a internação compulsória para uns é uma forma de tratamento, para outros não, é simplesmente uma forma de limpar a cidade.
Para o secretário carioca, o Rio de Janeiro decidiu adotar a medida que ele chama de abrigamento compulsório, depois de vários outras tentativas, como a Embaixada da Liberdade, uma espécie de casa de tratamento aberta, que não apresentou resultados efetivos. Tivemos mais de mil atendimentos. Só um jovem passou por lá 48 vezes e sempre voltou à cracolândia. E de 100 jovens atendidos, 25 já morreram, lembrou.
Bethlem explicou que o trabalho, determinado por uma resolução da Prefeitura com apoio do Ministério Público carioca e da Vara da Infância, Juventude e Idoso do Rio de Janeiro, realiza um trabalho de abordagem nas ruas com um equipe multidisciplinas: médicos, assistentes sociais e policiais. Primeiro fazemos abrigamento, em unidade própria da prefeitura Casa Viva e também em comunidades terapêuticas. Tratamos da saúde, e depois o trabalho de reinserção social, que é o mais difícil. Mas sem o primeiro passo, não é possível o segundo, enfatizou. Ele afirmou, ainda, que tratar da saúde é respeitar o maior direito da criança.
Compuseram, também, a mesa de debates: Sérgio Tamai, coordenador de Saúde Mental da Secretaria de Saúde de São Paulo; Mauro Aranha, do Conselho Estadual de Drogas do Estado de São Paulo; Luís Alberto de Oliveira (Dr. Laco), coordenador de Políticas sobre Drogas da Secretaria de Justiça do Estado de São Paulo; Lélio Ferraz, Promotor de Justiça do Núcleo da Infância e Juventude; Cid Vieira de Souza Filho, Comissão de Estudos sobre Educação e Prevenção de Drogas e afins; e Ariel de Castro Neves, vice-presidente da Comissão Especial da Criança e do Adolescente do Conselho Federal da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil).
O debate
Para o deputado Hamilton Pereira é muito perigoso adotar este tipo de política em um Estado que não tem locais apropriados, onde as pessoas seriam qualificadas como doentes por policiais. Hamilton ressaltou que é preciso antes ter prevenção, projeto terapêutico e planejamento.
O petista Adriano Diogo se colocou contrário a internação compulsória, afirmando que ela é irmã xipófoga do manicômio. Para ele, precisamos sim tratar das crianças.
Lélio Ferraz e Sérgio Tamai questionaram o secretário carioca sobre a legalidade da medida, se não estaria contrariando a lei federal 10.216/2001, que prevê como devem ocorrer as internações compulsórias e involuntárias.
Cid Vieira, Dr. Laco e Mauro Aranha expuseram sua preocupação de com a necessidade de políticas públicas para tratar e cuidar dos usuários do crack de forma sistemática e orgânica e que sejam construídas com a participação de toda a sociedade civil.
Para Ariel de Castro Neves, a internação só serve para casos excepcionais e deve estar baseada em estudo social e laudos médicos. Minha preocupação, na experiência relatada do Rio de Janeiro, é que primeiro recolhe e depois se faz a análise, disse.
Manifestações de representantes de movimentos e entidades, presentes na plateia, também expuseram sua preocupação com que a medida possa se tornar um ato de higienização pelo poder público ao retirar estas pessoas das ruas.
O coordenador da Frente, Donisete Braga, disse que a Frente continuará a promover debates, a visitar locais de tratamento, cracolândias, autoridades, fazer levantamentos, enfim, tudo que ajude na construção uma política pública para o problema, em conjunto com a sociedade civil.